sábado, 22 de junho de 2013

Preconceito e discriminação

Do preconceito à discriminação justificada
por Cícero Roberto Pereira e Jorge Vala no Número 2-3/2010

Um dos grandes paradoxos nas sociedades que têm definido o valor da igualdade como um dos seus princípios organizadores é a permanência de discriminação objectiva contra grupos minoritários mesmo tendo estas sociedades instituído normas sociais, orientações constitucionais e procedimentos jurídicos que condenam firmemente a expressão de preconceito e atitudes racistas. Como as pessoas (e também as instituições democráticas) discriminam outras pessoas percebidas como pertencentes a grupos diferentes sem serem acusadas de preconceito? Uma possibilidade pode estar no facto do actor da acção discriminatória usar alguma estratégia que lhe permite discriminar sem ser socialmente condenado. Por exemplo, pouca gente se organizaria ou mesmo participaria numa manifestação pública contra a imigração fundamentando a sua acção na ideia de que os imigrantes são inferiores ou vêem de uma cultura inferior, pois, se assim o fizesse, certamente estaria sujeita à condenação social. Contudo, qualquer pessoa pode demostrar publicamente a sua oposição à imigração, ou mesmo organizar e participar em manifestações anti-imigração, sem correr o risco de ser acusada de preconceito ou racismo. Normalmente, as pessoas expressam a sua oposição à imigração com base no argumento de que os imigrantes representam uma ameaça ao bem-estar económico da sociedade de acolhimento, podem contribuir para o aumento da criminalidade e para o enfraquecimento da identidade cultural desta sociedade.
Cícero PereiraCícero Roberto Pereira, psicólogo social pela Universidade Federal da Paraíba e doutor em Psicologia Social pelo Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa. Actualmente é investigador auxiliar no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, onde estuda o papel da legitimação da discriminação no âmbito das relações sociais decorrentes de processos migratórios em diferentes contextos normativos. Estuda também a aplicação de procedimentos estatísticos à teoria da medida e ao teste de modelos teóricos em Ciências Sociais. E cicero.pereira@ics.ul.pt

Neste exemplo, actos discriminatórios como o apoio a políticas discriminatórias contra imigrantes seriam interpretados como discriminação justificada (i.e., a discriminação sem preconceito). O problema coloca-se quando o recurso às justificações é visto ou sentido como sendo motivado pelo preconceito. Neste caso, o uso de justificações socialmente percebidas como legítimas pode ser o mecanismo encontrado pelo pensamento preconceituoso para legitimar a discriminação em sociedades e contextos igualitários. Seguindo este raciocínio, apresentamos aqui argumentos teóricos e evidência empírica que mostram a actuação deste mecanismo na expressão de comportamentos discriminatórios. Analisamos, com especial atenção, a forma como o apoio a políticas discriminatórias contra imigrantes na Europa vem sendo legitimado.

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